segunda-feira, 14 de julho de 2014

O QUE DIZEM

                 O que contam os netos       


    Quando faleceu, em 1965, Pedro Cabral deixou trinta e oito netos e cinco bisnetos.  
      O velho Pedro Cabral pregava peça com os netos no dia da mentira e vivia arranjando apelidos para eles. Os netos que nasceram antes de 1960, não esquecem aquele avô carinhoso e, às vezes, rígido, que tinha uma mão pesada para bater neles, quando  julgava que mereciam.
     Quando veio morar em Mossoró, à Rua Frei Miguelinho com a Rui Barbosa, Pedro tinha uma vacaria em sociedade com a filha Maria, no quintal da casa dela, à rua Silva Jardim, no bairro Doze Anos. Estelina, filha de Maria, desde criança ajudava o avô tirar leite e fazer as contas. Na época de colheita de melancia gostava de acompanhá-lo no roçado, no bairro Aeroporto. Ele passava às cinco horas da manhã  na casa de Maria para pegar Estelina, à época com nove anos: “Nem sempre mamãe deixava eu ir. Eu achava bom porque comia as melancias com ele”, lembra Estelina.  
   Quando Estelina tinha uns quatro anos, ele costumava pegar os netos nessa faixa de idade e dizia que quem beijasse o dedão do seu pé, ganhava  moedas: “O pé era bem limpinho, ganhei diversas vezes dois tostões, três e até um cruzado. Eu guardava para depois comprar um docinho, um bolinho, deixava no cofre que a gente tinha. De primeiro os adultos davam dinheiro criança”, recorda.
   Pedro sempre andou com dinheiro no bolso da calça. O restante guardava no banco. Quando fazia um pagamento contava o dinheiro tantas vezes até ter certeza que o dinheiro estava contado certo. “Eu nunca tive a certeza se era para não pagar a mais ou com medo de pagar a menos”, lembra Estelina.
   Gostava de contar estórias de trancoso para os netos. Eram estórias de rei, de rainha, que inventava para os netos contar para os outros.  Contava estória de botija, de alma:  “Ficávamos até altas horas ouvindo estórias de assombração, íamos dormir horrorizadas e acordávamos de madrugada, com medo”, disse Estelina.
     As crianças acreditavam em Saci, em caipora. 
  Sobre essas idas diariamente ao terreno no Aeroporto, Pedro Segundo lembra que o velho Pedro tinha amizade com uma mulher, dona de um prostíbulo, nas proximidades do terreno. Quando levava Segundo para o terreno, de vez em quando, no retorno,  fazia uma parada para tomar um cafezinho e ordenava que o neto fosse embora, o que despertava curiosidade em Segundo, naquelas visitas para um cafezinho.
   Um dos que provaram da mão pesada do avô é Canindé, filho de Inalda. Quando Pedro faleceu, Canindé tinha apenas sete anos de idade. Ele se lembra do terreno que o avô possuía no bairro Aeroporto, onde tempos depois a prefeitura se apossou e construiu a antiga rodoviária da cidade, tempos depois foi demolida e construíram a sede do  Centro Administrativo do município. A família foi indenizada pela prefeitura por um valor irrisório. Naquele terreno Pedro havia ‘montado’ uma filial da Fazenda São Pedro, onde mantinha uma plantação de frutas e verduras e criava um pequeno gado. Para lá ele se dirigia diariamente, juntamente com Luis Gonzaga, o Negaiz, que morava próximo. A família às vezes chamava o terreno de curral, outras vezes de roçado. Na verdade, era um sítio enorme já era dentro da cidade e havia poucas casas em volta. Negaiz contou que cada um levava o seu almoço e, após a refeição, deitavam no chão, embaixo de um pé de juazeiro, que ainda se mantém no mesmo local, próximo ao prédio aonde funcionou por muito tempo, a Central do Cidadão e Detran. 
      De vez em quando, Pedro levava Canindé e seu irmão, Rocha Neto, um ano mais velho, que Pedro apelidara de Mané Mococa. Ali, Pedro tirava leite das vacas, que as crianças traziam em baldes, à pé, até sua casa, no centro, junto da linha do trem, cerca de três  quilômetros. Numa dessas vindas, Canindé levou uma topada e derrubou bastante leite. “Ele não perdoou e meteu a mãozada em mim”, disse Canindé.
     Canindé jura que a melhor diversão de Pedro Cabral era botar os dois irmãos de castigo num quartinho escuro. Lembra bem do enterro do avô, pois na hora em que os adultos foram retirar o caixão da sala de sua casa, na rua Frei Miguelinho, ele e sua irmã caçula, Conceição, à época com apenas três anos de idade, agarraram o caixão, não queriam que levasse o avô: “Uma coisa que ele repetia demais é que “O homem que não tem uma casa para morar é como um cachorro, mora na casa dos outros”, recorda Canindé.
    Geruza, filha de Adelzira, conta que sua mãe passava aos filhos os predicados do pai. Ensinava que ele era um homem de vergonha: “Mamãe dizia que a cor não quer dizer nada, porque quem faz a pessoa é a sua personalidade de justiça, de paz, de respeito humano, de  dignidade. Sempre repetia que ele respeitava a família e o próximo, era um homem muito benquisto dentro de Mossoró. Ela nos ensinou a não sermos racistas, porque o pai dela era um homem moreno e que toda vida deu conta da família. Que apesar de termos avós paternos, brancos, de olhos claros, que correspondiam aos mesmos princípios de nosso avô materno, de bons princípios. Tive sorte até nisso”, explica Geruza.
      Pedro faleceu em Mossoró, em 13 de agosto de 1965, de trombose.                
                                   

       O QUE CONTAM OS BISNETOS
     Os bisnetos quase não sabem nada de Pedro Alves Cabral.                Quando faleceu deixou poucos bisnetos como Leda, Marileide, Vilaine, Francisco Linhares Neto e Ivana Maria. A primeira, Leda, estava com quatro anos de idade e a caçula, Ivana, apenas quatro meses.
        Alderir, ex-jogador de futebol e natural do Riacho Grande, em 2016, disse que desde cedo ouvia falar que Pedro era um bom pai de família. "Eu era menino e papai era muito amigo da família. A gente era vizinho no Riacho Grande. Papai dizia que seu Pedro era um homem de barriga cheia. A mercearia que ele tinha na fazenda, servia também para a redondeza. Papai comprava saco de arroz e feijão".    
 

    


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